quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Dia 3 - Sobre a desconfiança

Eu fui criada para acreditar nos meus princípios. Não apenas para acreditar, mas para viver de acordo com eles. E me tornei assim.

Questionadora, racional, argumentativa, atéia, feminista, esquerdista, insubordinada.

Muitas das coisas que acredito, não vieram apenas da minha família. Vieram de uma junção das situações que vivi, das pessoas que conheci, das coisas que realizei. Sempre achei que fazer alguma coisa que ferisse meus princípios fosse o pior dos pecados. Se vender minhas idéias, se prostituir minhas ações, como vou conseguir me olhar no espelho? Se eu abandonar a rígida ética que criei para mim mesma, quem sou eu para esperar um mundo melhor?

O problema é que mesmo seguindo à risca todos os meus ideais, algo não tem funcionado. Tenho me metido em muitas situações constrangedoras, tenho criado uma rotina bagunçada e infeliz, não tenho conseguido cuidar da minha saúde, dos meus pensamentos. Tenho começado projetos que percebo mais tarde não terem nada de comum com os meus sentimentos, tenho feito coisas que machucaram as pessoas que gosto, tenho perdido amores sem nem perceber, tenho me magoado. Todos os setores da minha vida, amoroso, profissional, cultural, social e financeiro, parecem ter sido atropelados por um tornado.

Comecei então a desconfiar de mim mesma, desconfiar dos meus princípios, desconfiar do meu taco, desconfiar do meu feeling. Porque se eu segui tudo isso e nada deu certo, o erro só pode estar nas minhas creças! Mas se eu vou desconfiar das minhas crenças, como vou saber quando estou dando um passo em falso? Que conjunto de valores vou usar para guiar minhas ações?

O psicólogo Ailton Amélio escreveu um texto incrível no seu blog sobre “Autodesconfiança e limbo psicológico”. Abaixo um trecho do seu artigo:

“Muitas pessoas têm procurado o meu consultório queixando-se que deixaram de perceber o que sentem e querem ou que percebem essas coisas, mas desconfiam de suas percepções.   Quando este fenômeno perdura, tais pessoas correm o risco de perderem a autoconfiança e cairem em uma espécie de limbo perceptual e emocional: ficam sem energia, amorfas e passaram a agir como se tivessem que pedir licença para existir. Elas também perdem o brilho e a vibração e evitam reivindicar espaço social. Aquelas que têm propensão para a depressão e sentem-se assim correm sérios riscos de ficarem deprimidas”


Eu perdi muito, mas muito tempo útil da minha vida, me perguntando o que causava tudo isso!

Até que um dia, estava conversando com uma amiga sobre um colega em comum que tinha sido amigo de nós duas num passado recente, mas que eu havia propositalmente cortado contato. Este camarada aprontou poucas e boas com ela, se mostrando manipulador, maquiavélico, mesquinho, egoísta e, pior do que tudo, um grande mentiroso. Minha amiga, muito machucada, me perguntou porque eu havia cortado relações com ele há alguns meses atrás.

Minha resposta foi que, por algum motivo senti que ele não tinha um bom caráter. Mas o que foi que ele fez?, ela perguntou. Nada. Absolutamente nada. Muito pelo contrário sempre me tratou super bem! Mas desde que eu o conheci, senti que ele não era digno de confiança. Alguma coisa no jeito dele, como falava, o que contava, não me parecia real, não me parecia sincero. E se ele estava usando uma máscara na minha presença, comecei a desconfiar o que ele queria esconder. Coisa boa não era. Pessoas do bem não têm nada à esconder. Então, mesmo sem provas concretas, resolvi seguir o meu instinto, e me afastar correndo dele. Eu poderia estar errada? Poderia. Mas não estava!

Foi no meio da conversa com essa amiga que me dei conta de que algumas vezes minhas ações são mais influenciadas pelos meus instintos do que pela minha racionalidade. E que, por incrível que pareça, nessa situações que resolvo escutar a minha voz interior, acabo escolhendo o melhor caminho.

Será então que o problema não é meu conjunto de crenças e princípios, mas o fato de eu raramente usar o meu instinto? Todos nós nascemos com o nosso, assim como qualquer outro animal. Mas até que ponto a vida moderna nos afastou dele? Será que me meto em roubadas, não porque meu racional está com defeito, mas porque perdi a pratica de olhar a situação também com os meus instintos?

Quando uma voz na nossa cabeça diz para nos afastarmos de tal lugar, de tal pessoa, quando dizemos que "nosso santo não bateu" com o de alguém, quando sentimos que uma situação é estranha, é o nosso instinto tentando nos guiar para ficar longe do perigo, seja físico, seja emocional.

Então, está mais do que na hora de deixarmos a racionalidade um pouco de lado e de afinarmos o nosso radar interno para nos guiar durante a nossa jornada. E tudo começa quando paramos diante de alguma situação ou pessoa e simplesmente perguntamos: o que eu estou sentindo em relação à isso?


Lição do dia: desenferrujando o meu instinto e botando o meu radar interno para funcionar.

Escreve para a Vero: eueoslobos@gmail.com


Um comentário:

Rachel disse...

Engraçado, mais uma vez eu me identifico muito com o que você escreve...
Me dá vontade de ler penas um post seu por dia, mas quero alcançar as suas atualizações, até pra saber onde você está no livro, se está perto de onde eu estou... ler junto!
O que eu pude ver na minha experiência"zinha" é que, como diria John Lennon, "a vida é o que acontece enquanto estamos ocupados fazendo outros planos". Uma coisa que costuma me ajudar quando penso nisso é entender que, da mesma forma que a vida põe coisas diferentes do que esperamos/planejamos, as nossas crenças e princípios também podem e devem mudar. O que a gente sonha aos 15 anos não é necessariamente o que nos serve aos 30. É preciso revisar também os princípios e crenças, porque senão corremos o risco de nos agarrar tão firmemente a sonhos que já se defasaram.
Bom caminho para nós e um beijo!