quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Dia 6 – Quem quer uma mãe-boa-demais?

Capítulo 3 – Farejando os fatos: O resgate da intuição como iniciação

Conto: Vasalisa
(Link para a história completa no menu à direita)

A primeira tarefa – Permitir a morte da mãe-boa-demais

Fiquei um tempão pensando se deveria escrever o que eu queria sobre essa primeira tarefa. Devo falar sobre a minha mãe? Mas ter problemas com sua própria mãe não é umas das características da adolescência? E eu, como mulher adulta já deveria ter resolvido esse assunto? Mas eu resolvi escrever esse blog para jogar as minhas verdades e pensamentos no vento, não é mesmo? Então vamos lá.

O casamento dos meus pais foi um dos mais bem sucedidos que eu já testemunhei. Muito amor, muito carinho, muita luta para criar os filhos da melhor forma possível, mesmo tendo o mínimo de dinheiro disponível. Eles sempre cumpriram o seu papel. Se matavam de trabalhar, nunca deixaram faltar nada em casa, se permitiam alguns luxos para os filhos, parcelados em vários anos claro, e comemoravam cada vitória, cada aumento, a primeira casa própria, a viagem dos sonhos.

Meu pai foi um ponto fora da curva padrão de pais. Tenho total consciência disso. Era comum vê-lo preparando nosso café da manhã, os lanchinhos da escola, de avental cozinhando uma macarronada (que era a única coisa que ele sabia fazer e era péssima, mas vale a intenção). Era ele que entrava com cuidado na masmorra de isolação que era meu quarto e sentava comigo na cama para perguntar como foi o meu dia. Foi meu pai que me levou pela primeira vez ao ginecologista, que fazia do-in e chás para mim quando vinham minhas terríveis cólicas menstruais. Que me dava colo, carinho, e abraços apertados quando eu chorava.

Foi ele que me ensinou como tirar manchas de roupas, a lavar meus sutiãs, a usar os eletrodomésticos. Era que me contava histórias antes de dormir, e que vinha me dar uma bronca quando estava na hora de cortar o cabelo ou de adicionar algumas peças novas ao meu surrado guarda-roupa. Com ele eu dividia meus sonhos, meus segredos, meus namoricos, meus planos. Ele sempre foi para mim uma mãe e um pai ao mesmo tempo.

Eu sempre me senti meio órfã de mãe. Não era ela quem deveria cuidar de mim? Dar carinho físico? Me dar conselhos? Falar sobre sexualidade? Não era ela quem deveria ter me ensinado como cuidar de mim mesma, cuidar da minha saúde, das minhas coisas, me levar no ginecologista, me ensinar a ser vaidosa? Mas ela não me ensinou. Nada.

Quando meu pai morreu e eu fiquei apenas com a minha mãe, foi quando eu percebi que não havia mais ninguém para cuidar de mim. Claro, casa e comida nunca faltariam, mas fiquei órfã de mestre. Fiquei órfã de cuidados. E cresci sem saber direito como me cuidar.

Quando comecei a levar os tombos e tapas da vida, comecei a culpá-la por não ter me ajudado a me preparar para o que vinha. Me sentia largada e desamparada, e quase sem forças para construir uma vida sozinha.

Com medo de só me dar mal, me retraí a ponto de parar de me arriscar. Eu tinha medo que as coisas continuassem a dar errado. Eu tinha medo de fazer planos. Medo de ser humilhada. Medo de fracassar. Medo de não saber cuidar de mim. Medo de tudo! E pior: comecei a arrumar mil justificativas para explicar essa falta de atitude!

Minha saúde anda ruim porque eu me alimento mal: ah, mas nunca ninguém me ensinou a cozinhar, cursos de cozinha custam uma fortuna, nem sei como fazer uma lista de compras e quais são os setores de um supermercado. Culpa da minha mãe!

Sou uma mulher adulta e me visto que nem uma adolescente: ah, mas nunca ninguém foi comprar roupas comigo, me ensinou sobre moda, nunca ninguém me disse que cor combina com o que, o que não usar, o que usar. Minha mãe sempre foi largada e cafona!

Não consigo cuidar da minha aparência: ah, mas nunca ninguém me ensinou a ser vaidosa, nunca ninguém me mostrou como usar maquiagem, cortar o cabelo, tirar sobrancelha, cuidar da pele. Culpa da única mulher da casa: minha mãe!

Meu namorados acabam virando minha mãe postiça: ah, mas alguém tem que cuidar de mim, não é? Quem vai me lavar chá quando eu estiver com dor? Quem vai me embrulhar à noite quando eu estiver com frio? Quem vai me dar conselhos profissionais? Todo mundo teve mãe, mas eu não!

Não me arrisco para nada: ah, mas se der errado quem vai me ajudar a me levantar? Quem vai me dar conselhos? Nunca ninguém me ensinou como fazer para saber se estou errando ou não! Afinal, a vida profissional e financeira da minha mãe sempre foi uma tragédia!

Resumindo: uso toda essa minha sensação de abandono e toda essa minha carência para justificar o fato de que não cuido de mim.

E o que a primeira tarefa do livro ensina?

“As tarefas psíquicas desse estágio da vida da mulher são as seguintes: aceitar o fato de que a mãe psíquica protetora, sempre vigilante, não é adequada para ser guia para a futura vida instintiva da pessoa (a mãe-boa-demais morre). Assumir a realidade de estar só, de desenvolver a própria conscientização quanto ao perigo, às intrigas, à política. Tornar-se alerta sozinha, para seu próprio proveito; deixar morrer o que deve morrer. À medida que mãe-boa-demais morre, a nova mulher nasce.” Capítulo 3.

De todas as mulheres que conheço, a grande maioria precisa se livrar da mãe-boa-demais que as persegue internamente, evitando que elas se joguem aos desafios da vida. “Essas vozes dizem frases como as que se seguem, “ora, não diga isso”, “você não pode fazer isso”, “tudo é perigoso lá fora”, “quem sabe o que será de você se insistir em sair desse ninho quentinho”, “você vai se humilhar, sabia?”, ou ainda, a sugestão mais insidiosa “finja que está se arriscando, mas em segredo continue aqui comigo”.”

Mas e eu, que nunca tive uma mãe-boa-demais me protegendo? “Essa interrupção no processo de iniciação da mulher ocorre por vários motivos, como quando por exemplo (...), não houve uma presença uniforme da mãe “suficientemente boa” nos primeiros anos da vida.”

Do que me adianta eu não estar deixando essa mãe-boa-demais interna me proteger, se continuo incessantemente buscando por ela?

Não! Essa é a hora que eu tenho que entender que estou sozinha, e que se alguém vai me proteger e cuidar de mim sou eu mesma. Mais do que tudo, essa é a hora de eu me libertar de todos esses meus medos vindos do abandono, e começar a me lançar nos desafios da vida, nos problemas a serem resolvidos, usando a minha intuição como guia.

Já era a mãe-boa-demais presente ou ausente, hora de deixar a Mãe Instintiva, a Mulher Selvagem zelar pelos meus passos.

Como? Aguardem as próximas tarefas.

Para me ajudar nesse processo, peguei um caderno usado que estava largado em casa. Eu e os cadernos, rsrsr! Nele vou escrever as minhas pendências, coisas que posso fazer para aprender a me cuidar, e desafios que quero me jogar!

Além disso, cada vez que eu me ver justificando meus atos, vou gritar bem alto dentro da minha cabeça: SE JUSTIFICAR É COISA DE GENTE PEQUENAAAA!!!!

Lição do Dia: aprendendo a cuidar de mim sozinha, usando a minha intuição como guia.

Pendências: Última semana de convênio médico antigo, exames marcados e reunião com o convênio para mudança de plano agendada.

Quer comentar? Escreva para mim: eueoslobos@gmail.com

7 comentários:

vanessa panambi. disse...

tô adorando acompanhar essa saga...dá vontade de compartilhar mil coisas, ainda mais eu, aqui, grávida, farejando sinais...

beijo!

Carla Farinazzi disse...

Verônica... sou sua fã
incondicional e torço por você.

Sempre.

Esse livro foi a melhor coisa que me aconteceu.

[Obs.: a mãe segue sendo a figura central, ausente ou presente demais. é incrivelmente absurda a nossa ligação com ela.]

Um beijo, querida.

Carla Farinazzi

Daniii disse...

Tenho acompanhado dia a dia, e seguido suas lições, mas hoje especialmente me identifiquei com vc, também tive (tenho) uma mãe ausente, meu pai quem sempre cuidou de mim, e qdo eles se separam me senti assim como vc... meio orfã =/
Quero muito me livrar desse peso da mãe boa demnais ausente... por favor post quais serãos os passos para isso!!

Parabéns pelo blog!!

Beijos e estamos juntas!

Verônica disse...

Queridíssimas, obrigada pelos comentários e qualquer sugestão, qualquer uma mesmo, é só escrever para mim: eueoslobos@gmail.com

Beijos

Até em breve!

Petit Gabi disse...

Apesar de não ter o que reclamar da minha mãe, mesmo porque tive duas: mãe e vó rs, já me senti com esse medo de não dar conta de tudo sozinha. Também já me apoiei demais em namorados. Não foi fácil! Hoje acho que estou conseguindo caminhar com minhas próprias pernas, meio aos tropeços, mas tô seguindo em frente.
Tô adorando a saga! Bjs

Aldo Liro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ana Cecilia disse...

Muito bom este post. Acrescentou à minha reflexão.