quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Dia 7 – Sou submissa à madrasta má?

Capítulo 3 – Farejando os fatos: O resgate da intuição como iniciação

Conto: Vasalisa
(Link para o conto completo no menu à direita)

A segunda tarefa – Denunciar a natureza sombria

“São as seguintes as tarefas desse período: aprender ainda com maior conscientização a largar a mãe excessivamente positiva. Descobrir que ser boazinha, que ser gentil e simpática não fará a vida florir. Vivenciar diretamente a própria natureza sombria, especialmente os aspectos exploradores, ciumentos e rejeitadores do self. Incorporar esses aspectos. Criar o melhor relacionamento possível com as piores partes de si mesma. Deixar acumular a tensão entre quem se aprendeu a ser e quem se é realmente. Trabalhar, afinal, no sentido de deixar o velho self para que nasça o novo self intuitivo.”

Essa importantíssima tarefa é explicada pela autora usando a figura da madrasta má de Vasalisa. Já repararam que em muitos contos de fadas tem uma madrasta má que atormenta a pobre princesinha durante toda a sua infância? Não é à toa.

Clarisse explica que o símbolo da madrasta má representa os aspectos exploradores e destruidores de nossa própria psique. Quase sempre eles são fruto da sociedade e da cultura em que vivemos, ou de nossa família de origem, que não nos dava muito valor. O problema é que nós acabamos internalizando esses aspectos, sem perceber que agora eles estão vindo de dentro na nossa cabeça, e não mais do mundo lá fora. São pensamentos do mal que funcionam como as madrastas más dos desenhos, azucrinando os nossos planos.

Para esse exercício resolvi contar uma situação problemática que estou vivendo atualmente. Algo que me faz mal, mas que continuo aceitando por qualquer motivo que seja.

Meu emprego.

Eu consegui meu atual emprego depois de um longo período desempregada, por indicação de um amigo que achou que eu era a pessoa perfeita para o cargo. Eu percebi logo na entrevista, que não era eu que era incrível, o cargo é que era muito baixo. Mas aceitei, disposta a ficar por um tempo até colocar a minha vida de volta nos trilhos.

O esquema era trabalhar 6 dias por semana, sem hora de almoço, ganhando um dos piores salários da minha vida, praticamente apenas atendendo o telefone. Topei. Afinal, precisava sair do buraco, e sair do buraco sentadinha na frente de um computador com acesso à internet, não era de se jogar fora, não é?

Mas eu estava frustrada porque pensava que a empresa nunca ia ver que eu podia muito mais do que atender ao telefone, eles nem leram o meu currículo para perceber que já estive em grandes universidades. Mas, inacreditavelmente, meus chefes começaram a perceber que eu era muito mais inteligente e capaz do que eles imaginavam para a vaga.

Começaram a pedir favores, que iam ficando mais difíceis com o tempo. E eu só pensava, “nossa, se eu fizer direitinho, eles vão ver que eu posso muito mais”. E dava tudo de mim. Conseqüentemente, minhas responsabilidades começaram a aumentar! Quando eu dei por mim, estava pilotando praticamente sozinha um setor inteiro da empresa. Isso, em 8 meses de trabalho.

Eu ganhei algum aumento por isso? Hahaha. Cada vez trabalhava mais, me estressava mais, mas não ganhava um centavo de aumento. Mas eu estava feliz claro, afinal, se estavam me dando mais responsabilidades significava que percebiam que eu era boa, e eu me sentia valorizada cada vez mais.

O tempo foi passando e eu comecei a ser chamada para cuidar de projetos pessoais dos meus chefes, à parte da empresa. Cheguei por exemplo a cuidar de eventos para centenas de pessoas, sozinha, usando todo o meu tempo livre para tudo sair perfeito, e não ganhei nada por isso. Além de tudo, coisas que eu fazia como favor, agora eram obrigações, comecei a ser super cobrada, levar muita bronca, e nem um obrigado eu recebia de volta.

Mas eu estava triste? Não, estava muito feliz! Estava fazendo trabalhos que nunca havia feito antes, estava aprendendo, me descobrindo, me sentindo capaz, nossa era o máximo! Mal me lembrava que minha conta bancária ainda estava no negativo e que minhas dívidas só aumentavam. Mesmo assim, cada vez que me pediam para pilotar novos projetos, eu abanava a cabeça como um cachorrinho educado, latindo “muito obrigada pela oportunidade senhor!”.

Quando completei um ano, eu estava cuidando de dois dos maiores setores da empresa. Era uma puta responsabilidade! Eu tinha que freqüentar reuniões com gente muito mais foda do que eu, normalmente jornalistas, produtores, RPs, eu tinha que estudar para caramba, aprender com meus erros, que foram muitos, e manter a cabeça erguida, sem parar, sem demonstrar cansaço. Não tinha tempo de estudar para a faculdade, e nem consegui pagar a mensalidade com meu salário. Larguei a faculdade. Pela terceira vez! E o pior é que meu salário começou a diminuir, porque ainda ganhava para atender o telefone, e quando mais novas coisas eu fazia, menos eu... atendia o telefone!

Mas vocês devem estar se perguntando, porque raios eu aceitava tudo isso? Eu estava me sentindo boa em alguma coisa como há muito tempo não sentia, eu estava achando que finalmente estava sendo compensada pelo meu bom comportamento, e que em breve, eu não precisaria ficar provando o meu valor todos os dias, simplesmente meus chefes me dariam um salário à altura da minha função. Não sentia raiva deles, pelo contrário, me sentia grata!

Essa história lembra algum conto de fadas para vocês? Para mim lembra: “A Gata Borralheira do Escritório”.

O tempo continuou passando e eu continuei cada vez mais cobrada, mais forçada, mais estressada. Meus chefes cada vez mais duros, mais exigentes, mais perfeccionistas. Até que eu olhei à minha volta e percebi: o que diabos está acontecendo por aqui?

Eu achei que estava tentando provar o meu valor para meus chefes, mas não. Eu estava tentando provar meu valor para a voz na minha cabeça que dizia: “Você não sabe fazer isso. Você não é boa nisso. Você não tem a coragem necessária. Você é tola, sem graça, vazia. Você não tem tempo. Você só em boa para as coisas simples. Só se permite que você faça esse tanto e nada mais. Desista enquanto pode!”

Eu estava escravizada, mas não era pelos meus chefes, era por essa madrasta má, que habitava meus pensamentos e dizia o tempo todo que eu não tinha valor. Não queria provar nada para ninguém, eu queria era calar essa maldita voz!

“Nesse estágio da iniciação, a mulher vê-se acossada por exigências banais da sua psique que a exortam a atender qualquer desejo de qualquer um. A obediência provoca uma descoberta chocante que deve ser registrada por todas as mulheres.”

Eu estou permitindo que me façam de trouxa! Sou eu que estou dando poder para eles!

“Nós também sofremos interceptação quando a madrasta que existe em nós e/ou à nossa volta nos diz que, para começar, não valemos muito e insiste em que nos concentremos nas nossas falhas, em vez de perceber a crueldade que gira ao redor – seja dentro da psique, seja dentro da cultura. Como Vasalisa podemos tentar ser gentis quando devíamos ser espertas. Podemos ter sido ensinadas a pôr de lado o insight penetrante com o objetivo de não criar problemas. Contudo, a recompensa por se boazinha, em circunstâncias repressoras, é a de ser mais maltratada. Embora a mulher sinta que, se for ela mesma estará se afastando dos outros, é exatamente essa tensão psíquica que é necessária para criar a alma e promover mudanças.”

Resumo da história: há três semanas cheguei ao meu limite emocional. Chorei, esperneei, amaldiçoei o mundo cruel, me decidi e resolvi me dar o luxo de perder o meu emprego: pedi um aumento! O que aconteceu? Meu aumento foi autorizado em menos de 48hs. A história tem um final feliz, mas caso não tivesse, eu já estava pronta para partir para outra.

Lição do Dia: percebendo que a madrasta má da minha psique é cria minha, e que são as minhas inseguranças e passividade que a alimentam.

Pendências: usando o meu aumento de salário para organizar as minhas dívidas.

Leia o conto 'Vasalisa' completo: http://querocorrercomoslobos.blogspot.com/p/vasalisa.html

Quer comentar? Escreva para mim: eueoslobos@gmail.com

2 comentários:

Petit Gabi disse...

HAHAHAHA Adorei o final feliz!!! Também estou nessa batalha pelo reconhecimento profissional, na verdade, estou mais na fase do aprimoranento (que nunca acaba, né?). Me sujeito a um salário irrisório em nome da experiência, mas estipulei um prazo para isso. Então, talvez eu esteja fazendo a coisa certa. =*

Aldo Liro disse...

Legal esse blog.
Acho que cada um tem sua relação com a mãe - presente, ausente, protetora e etc...
minha mãe sempre foi presente e tb protetora na infância.
Mas tb foi trabalhadora e batalhadora e me deu esse exemplo de mulher que vai atrás do seu objetivo. Só sinto que ela não sej aum a pessoa instintiva e que tenha passado prá mim a confiança nos meus instintos - parece que ela diz um pouco - finja que se arrisca mas fique aqui no quentinho.
Mas acho que nossas mães não são culpadas! EU sou mãe e me sinto culpada... mas quero oferecer prá minha filha, que já tá com 18 anos a segurança de confiar nos instintos dela.
E entender que minha mãe não me deu essa segurança dos instintos porque ela tb não a tem. E quer me proteger porque queria ser protegida pela mãe dela até hoje...
meu pai tb tem seu lado protetor mas solta bem mais e coloca prá correr na floresta - prá que eu tenha a segurança de enfrentar a baba iaga sozinha!
Não culpemos nossos pais por nada! são crianças - como nós!
E no fim o que importa não é o que fizeram com a gente e sim o que a gente faz com o que fizeram com a gente! SOmos donas do nosso destino!