segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Dia 26 – Porque você quer amar?

Capítulo 5 – A caçada: Quando o coração é um caçador solitário

Conto: A Mulher-esqueleto: Encarando a natureza de vida-morte-vida do amor

As primeiras fases do amor: A descoberta acidental do tesouro

“Os seres humanos imprudentes são propensos a se acercar do amor do mesmo jeito que o pescador da história encara o que apanhou: Ah, espero apanhar um bem grande, um que me alimento por muito tempo, um que seja interessante, que facilite a minha vida, do qual eu possa me gabar com todos os outros caçadores do meu lugar’.”

“É esse o movimento natural do caçador ingênuo e esfaimado. Os muitos jovens, os não-iniciados, os famintos e os feridos têm valores que giram em torno da descoberta e conquista de troféus. Os muito jovens ainda não sabem exatamente o que estão procurando; os famintos buscam o sustento; e os feridos procuram a compensação por perdas anteriores. No entanto, todos querem que o tesouro ‘caia por acaso’ dos céus.”

Têm valores que me agradam e têm valores que não me agradam. Pessoas que procuram um relacionamento para fazer plano de carreira e financeiro, para levarem o parceiro por aí como troféu, ou para curarem a dor de uma ferida me desagradam. Pessoas que buscam um amor apenas pelo que ele é, e mais nada, muito me agradam.

Como eu acho que os meus valores estão no segundo lote, pouco posso comentar a meu próprio respeito. Tive vários relacionamentos, amei pelo tempo que durou e da forma que encontrei, e fui amada, por cada um dos meus parceiros, à sua maneira.

Já tive parceiros que me queriam pelos motivos mais diversos. Lembro de um, que adorava me mostrar para os amigos num estilo ‘olha a gata rebelde que consegui para mim’. Ele não acompanhava minhas idéias, meus princípios, minhas filosofias. Ele apenas gostava do fato de que eu as tinha e que eram diferentes dos padrões do grupo dele.

Outro, tinha medo de mim exatamente por isso. Ele namorava uma menina séria, entediante e absolutamente ordinária, do tipo pra casar e apresentar pros pais. Mas ele não estava interessado em se envolver amorosamente com ela, então veio atrás de mim propondo me dar o cargo de amante que, na visão dele, é a mulher que pode ser divertida, liberal e ter pensamentos próprios. Dizia que me adorava, mas morria de medo de me apresentar para os amigos, porque, palavras dele, eu era feminista e insubordinada.

Um outro namorado, recém separado, me queria de todo o jeito porque estava muito machucado. Ele dizia que o meu modo de amar, natural e altruísta, era tudo o que ele estava precisando para que ele desse valor de novo à vida. Que ele me queria como um ‘anjo’, sim ele usou essa palavra, que o lembrasse o que é felicidade.

O meu atual namorado disse logo de cara que o negócio com ele era sério: ele queria uma pessoa interessada em partilhar um futuro. Família estilo propaganda de margarina, filhos, cachorro e luxos. Lembrando que tudo isso não era opcional. Chegou a me perguntar logo numa das primeiras conversas que tipo de cerimônia religiosa eu preferiria para unir as duas famílias. Veja bem: a família dele é evangélica tradicional, e eu sou atéia ortodoxa com mãe em gêmeos.

Mas eu escolhi esses quatro casos para contar, não porque eles tinham motivos estranhos para amar. Não. Eu escolhi esses 4 porque foram com eles que eu presenciei o verdadeiro milagre que esse trecho do livro fala:

“Às vezes, os amantes começam do mesmo modo. No início do relacionamento, estão só a procura de um pouco de emoção, ou de uma dose antidepressiva de uma ‘companhia para me ajudar a passar a noite’. Sem que percebam, eles desavisadamente penetram numa parte da sua própria psique e da psique do outro habitada pela Mulher-esqueleto. Embora seus egos possam estar à procura do prazer, esse espaço psíquico é terreno sagrado para a Mulher-esqueleto. Se sairmos para pescar nessas águas, podemos ter certeza de que a fisgaremos. O pescador considera que está apenas em busca de nutrição e de alimento, quando na realidade está trazendo das profundezas a natureza feminina por inteiro.”

E o que aconteceu foi exatamente isso: quando passou o primeiro momento, eles olharam para mim e perceberam que o que haviam fisgado era muito mais do que eles queriam. Lembro que a paixão gerada nesses quatro relacionamentos foi coisa de filme! O primeiro, esqueceu que eu era primeiramente um troféu e se jogou. O segundo largou a namorada para criar um relacionamento comigo. O terceiro esqueceu o passado e conseguiu me encarar pelo diferente que eu era. O quarto rompeu com a religião da família para ter a liberdade de escolher a parceira que queria.

Quatro relacionamentos lindos que eu tive na minha vida. Quatro vezes que aprendi a esperar pelo depois do encantamento. Quatro pessoas que mudei e que me mudaram da mesma forma. Quatro homens que me são queridos até hoje.

Algumas amigas, incrédulas, me perguntam até hoje como foi que eu consegui gerar um relacionamento de começos tão errados. Eu digo para elas que cada vez que elas rejeitaram um cara porque a paixão terminou, ou porque eles não se enquadram no ‘alimento’ que elas buscavam no amor, elas podem ter perdido o início de uma linda relação.

“Ficar deitado inerte, apenas sonhando com um amor perfeito, é fácil. É uma espécie de anestesia da qual talvez não nos recuperemos nunca, a não ser para agarrar impiedosamente algo de valor, apesar de estar além da nossa percepção. Para os ingênuos e os feridos, o milagre dos caminhos da psique está em que, mesmo que realmente nem esperasse por isso, que não queira, que não tenha essa intenção, que não se sinta digno, que não se sinta pronto, você de qualquer jeito irá topar, por acaso, com o tesouro. Depois, cabe à sua alma a tarefa de não ignorar o que veio à tona, de reconhecer o tesouro pelo que ele for, não importando o quanto sua apresentação for inusitada, e de refletir com cuidado acerca do que fará em seguida.”

É impressionante que ainda hoje as pessoas sonhem com relacionamentos eternos, perfeitos e felizes. Uma coisa que aprendi é que o amor é um pacote só: alegria e tristeza juntas. Uma relação de verdade é aquele que inclui os defeitos do outro, a fragilidade, os medos, as feridas, as cicatrizes, o mau-humor matinal. Como diz um amigo meu: um relacionamento só começa depois que os dois amantes trazem sua trouxinha de merda e abrem na frente um do outro. Acho lindo!

“Sabemos que os relacionamentos às vezes vacilam quando passam do estágio esperançoso para o estágio de encarar o que realmente está preso no anzol. (...) A ligação iniciada com toda a boa vontade oscila e balança, às vezes até cambaleia, quando o estágio de ‘enamoramento’ se encerra. Depois, em vez de encenação de uma fantasia, começa a sério um relacionamento mais desafiador, e toda a nossa experiência e habilidade precisam ser postas em ação.”

“Repetidas vezes observo um fenômeno em amantes, independente do sexo. Seria mais ou menos assim: duas pessoas começam uma dança para ver se elas vão querer se amar. De repente, a Mullher-esqueleto é fisgada por acaso. Algo no relacionamento começa a diminuir e cai em entropia. Com freqüência, o doloroso prazer da excitação sexual se abranda, um passa a perceber o lado frágil e ferido do outro, ou ainda um deixa de ver o outro como ‘material digno de admiração’. (...) Digo-lhes que essa é uma hora mágica. Isso pouco os tranqüiliza. Digo-lhes que agora iremos ver algo fantástico. Eles têm pouca fé. Digo-lhes para não soltar a mão, e isso eles mal conseguem fazer.”


Lição do Dia: aceitando a trouxinha de merda do meu parceiro.

Pendências: pagando as contas atrasadas, ai que dor! : )

Escreva para a Vero: eueoslobos@gmail.com

6 comentários:

Amélie Poulain disse...

"Digo-lhes para não soltar a mão, e isso eles mal conseguem fazer"

Foi complicado perceber que eu teria que soltar aquela mão...mas enquanto me fez bem, segurei firme, e dei o melhor de mim.
Pena que a trouxinha de merda dele era demais. Coisas que não teria como aceitar sem me rasgar.
Aí não rola mais...

Mas agora que passou a magoa, desejo que ele seja muito feliz!
De coração.
E fico feliz em saber que os amores podem ser assim de verdade: com começo, meio e fim. E mesmo assim, verdadeiros.

Beijão Vero!!!

Adoro passar aqui e me fortalecer com seus textos!!

Mayra Di Manno disse...

Verônica,
Excelente seu blog!
O conheci pelo blog da Carla.
Fiquei bastante tocada, a idéia é das melhores.
Um beijo,

Daniii disse...

Perfeito o post de hoje, não vejo a hora do meu livro chegar, acabe de encomendá-lo!!!

"um relacionamento só começa depois que os dois amantes trazem sua trouxinha de merda e abrem na frente um do outro" Ameiii isso!!

Bjos!!

Verônica disse...

Amélie,

É preciso coragem para abrir as nossas trouxinhas e encará-las! O que vamos encontrar, aí é uma surpresa...

Sempre brinco que existe uma escala de 1 a 5 de defeitos de parceiro: o 0 quase não incomoda, o 3 sabemos lidar, o 5 torna nossas diferenças inconciliáveis. Concorda?

Beijos,

Vero.

Verônica disse...

Olá Mayra, obrigada pela visita!
Sugestões: eueoslobos@gmail.com
Beijos,
Vero.

Verônica disse...

Daniii,

Que maravilha, você encomendou o seu livro? Por favor, me mande um e-mail quando começar a ler e me conte o que você está achando, ok?

Beijos,

Vero.