Capítulo 8 – A preservação do Self: A identificação de armadilhas, arapucas e iscas envenenadas
Conto: Os Sapatinhos Vermelhos
(Link para a história completa no menu à direita)
O retorno à vida feita à mão, a cura dos instintos feridos
Aposto que muitas de vocês já ouviram o termo Período Sabático. Esse termo vem lá do Antigo Testamento e se referia a um período a cada sete anos em que a terra ficava em repouso e sem cultivo, para depois iniciar mais um ciclo de fertilidade. Além disso era como chamavam os sábados para os judeus, o dia da semana em que eles paravam de trabalhar para cuidar da vida religiosa.
Nos dias de hoje o Período Sabático significa uma pausa em todas as suas tarefas pessoais, familiares e profissionais, para reavaliar suas necessidades, quais são as coisas importantes para você, e recuperar a sua qualidade de vida. O principal objetivo de quem realiza um Período Sabático é a reavaliação de sua vida pessoal. Não importa a duração que ele tenha, é o tempo que tiramos para colocar a vida nos trilhos novamente.
Esse período que ela fala é exatamente o tempo que vamos tirar parar de correr para completar nossas tarefas, para parar de trabalhar para pagar as contas, parar de se matar por metas financeiras e profissionais. É o período que vamos parar de fazer tudo que tenha relação com o mundo ou com os outros e nos voltar apenas para nós mesmas. Quem eu sou? O que eu quero? Do que sou feita? Que vida eu quero ter? São todas as perguntas que vamos tentar buscar respostas nesse período de afastamento
Está na hora de você começar o projeto psicológico de voltar para o seu self.
É claro que não somos todas que temos disponibilidade e dinheiro para sair viajando pelo mundo ou fazer um retiro espiritual. O que eu quero propor para vocês é outra forma de conseguir esse afastamento. É o que eu estou fazendo desde meados do ano passado e que tomou forma com o lançamento desse blog. O que eu fiz foi: deixei tudo em stand by. E quando digo tudo, quero dizer literalmente: TUDO.
Pause
Quando você permite deixar a sua vida concreta e material em stand by, automaticamente você vai parar de correr. Você vai perder a sensação de obrigação relacionada aos seus objetivos, porque você não estará mais trabalhando no desenvolvimento delas. Você vai apertar a tecla do PAUSE da sua vida e deixá-la assim pelo tempo que precisar. Vamos combinar: ou você continua com sua rotina louca ou estressante, ou você pausa para repensar na sua essência. As duas coisas juntas não dá. Tenha dois mantras nesse período: ‘Eu não preciso fazer nada’ e ‘eu não devo fazer coisa nenhuma’. Os outros são cheios de nos falar que precisamos decidir tal coisa, que devemos fazer tal outra. Não! A única coisa que precisamos e devemos fazer é cuidar de nós mesmas. Só, mais nada.
O primeiro passo é fazer uma lista de coisas que são estritamente necessárias para que você continue vivendo. No meu caso havia apenas uma coisa que eu não poderia parar de fazer: trabalhar. Reuni todas as minhas contas e decidi deixar apenas as essenciais. Voltei para a casa da minha mãe e larguei o apartamento que vivia. Embora pareça mais estressante voltar para a casa dos pais, eu precisava largar o papel de ‘dona de casa’ e brecar o aumento das minhas dívidas. Eu não me relaciono bem com a minha mãe, por isso deixei bem claro que precisaria que ela me recebesse em sua casa para conseguir ‘reorganizar a minha vida’. Por mais difícil que ela seja como mãe, tem coisas que mãe não pode negar.
Como a única coisa que eu não poderia parar de fazer era trabalhar, me certifiquei de que o trabalho em que eu estava era estável e me dava um mínimo de renda para pagar as contas básicas: alimentação, convênio médico e transporte. Todo o restante eu considerei supérfluo. Me propus também a ficar no meu atual emprego pelo tempo que durasse esse meu retiro, por pior que ele fosse, por mais tédio que eu sentisse, eu ficaria. Tranquei a faculdade, mas já sabendo que eu não iria voltar. Pensaria nisso depois.
Primeiras atitudes
Depois disso veio a idéia de procurar ajuda psicológica. É claro que nem todo mundo precisa ir para a terapia, mas nada como um profissional da área para te ajudar nessa jornada. Lembro até hoje da minha primeira consulta. Eu virei para a terapeuta, que me via pela primeira vez na vida, e disse: ‘Estou aqui porque a minha vida está um caos e nem sei por onde começar a arrumar. Não tenho o perfil de precisar de terapia a vida inteira. Preciso da sua ajuda para me reorganizar, deixar minha psique saudável, e já partir para a próxima etapa!’. ‘Quanto tempo você imagina que dure esse processo?’, ela me perguntou. Eu respondi na lata: ‘Um ano no mínimo, dois anos no máximo!’. No mês passado eu completei um ano de terapia, e vamos embora para o segundo ano.
Tente bloquear o maior número de influências externas: conceitos culturais, aspectos sociais, dogmas religiosos. Não permita que nada, além de você, influencie na sua vida. Se isole psicologicamente o máximo possível do mundo externo: as respostas não estão lá fora, estão dentro de você.
Limpe tudo. Limpe sua casa inteira, se livre de todas as tranqueiras que não usa mais. Doe e jogue fora absolutamente tudo que você não usa há mais de um mês. Abra seu armário de produtos de beleza: como mulher junta um monte de plásticos cheios de creme, não é? Jogue fora o que passou da validade, dê para as amigas ao que você testou e não gostou, se livre daquele creme incrível que você nunca lembra de passar. O mesmo para seus papéis, para seus livros, para o seu guarda-roupa, para a sua cozinha, armários de mantimentos, tudo. Não tenha pena de jogar fora o que já foi importante para você no passado. A única coisa importante do seu passado é a sua experiência de vida. Limpe e organize todos os espaços físicos que você freqüenta.
A mudança para a casa da minha mãe foi perfeita para isso. Hoje meus pertences pessoais se resumem a uma caixa 30x30cm, onde estão os produtos de higiene que eu realmente uso, e que são necessários para uma rotina de beleza prática, simples e eficiente. Meu guarda-roupa se resume as mudas de roupa necessárias para apenas uma semana. Eu cheguei num ponto onde nem as roupas que eu usava me definiam. Deixei apenas as peças básicas, para uso diário, lisas, de cores neutras. No final de uma semana eu lavo as roupas, e recomeço.
Por último, se você ainda não tem, está na hora de organizar um ambiente para seu trabalho pessoal. Um lugar que seja apenas seu, que você se sinta confortável e isolada. Onde pode deixar seus pensamentos fluírem e sua criatividade funcionar. Pode ser um pequeno jardim no seu apartamento, um escritório, um cantinho da sala. Nele é que vão acontecer os seus mais importantes trabalhos psíquicos.
Os Outros
Logo depois eu terminei o meu então atual relacionamento amoroso. Estava saindo há três meses com um cara muito bacana, mas que eu não sentia grandes emoções, e sabia que estava meio que esperando alguma coisa acontecer. Um relacionamento meia-boca era a última coisa que eu precisava. Então simplesmente terminei, liguei para o meu ex-namorado que ainda amava e pedi para voltarmos. Voltamos. Viver aquele amor era uma das pendências emocionais que eu tinha, e eu também sabia que ele seria o parceiro ideal para me apoiar nessa jornada. Mas, se você estiver sozinha quando iniciar seu período sabático, o melhor a fazer é realmente permanecer sozinha.
Fique de olho nos seus amigos mais próximos: se eles não vibram na mesma sintonia que a sua, se só reclamam e se fazem de vítimas, se são extremamente civilizados, se eles se iludem, ou estão perdidos, não são a companhia ideal para você. Procure ficar perto apenas das pessoas interessantes, prósperas e que te apóiem incondicionalmente. São elas que vão te ajudar a usar o máximo do seu potencial nesse período.
Não perca tempo com eventos sociais desnecessários, com encontros que você não está tão a fim de ir, com pessoas enfadonhas e eventos que envolvem conversas superficiais. Use seu cérebro e seu tempo para coisas mais úteis.
É preciso que as pessoas ao seu redor saibam que você está tirando um período sabático e deixando as coisas em stand by. Elas vão se assustar, se chocar, e até tentar convencê-la de que é uma perda de tempo. Ignore e diga que a decisão está tomada e é irrefutável. Não importa o quanto seja forte a pressão externa, não tome nenhuma decisão de grande porte nesse momento. A idéia dessa pausa é exatamente descobrir quem você é, então não é a hora de decidir os próximos passos.
Organize
Logo em seguida eu fui tentar parar as bolas de neves: negociar dívidas e diminuir consumo. Organize suas finanças e reveja os seus gastos. Pare absolutamente de consumir o que não for necessário. Não, um lindo casaco vermelho não é o que você mais precisa nesse momento. Se for gastar seu dinheiro, gaste com experiências que te agreguem valor e prazer.
É hora também de terminar relações que não valiam mais a pena, discutir as relações que ainda valiam, resolver os problemas pessoais, os impasses, os perdões, as brigas. Falar tudo o que estava guardado no peito, fazer declarações de amor, ou escrever cartas de término.
Fique longe de críticas, julgamentos e opiniões alheias. Não se interesse demais pela vida dos outros, lembre-se que os problemas deles são deles, e você tem os seus próprios para cuidar. Não permita que as pessoas questionem, critiquem ou julguem sua vida. Deixe claro que a sua vida é problema seu, e de mais ninguém.
O que fazer
Se expresse. Pinte, cante, dance, interprete, escreva. A expressão artística é a melhor forma de lidar com os sentimentos mais profundos da alma. Leia e estude. Sobre filosofia, sociologia, psicologia, artes. Leia ‘Mulheres Que Correm Com Os Lobos’ e coloque em prática as suas lições. Analise sua vida, reflita, pense, entenda, mude.
Resolva as pendências do passado. Conflitos emocionais, traumas, feridas. Deixe tudo cicatrizar. Decida nunca mais reclamar, se queixar ou se fazer de vítima. Entenda as coisas ruins que aconteceram e as aceite. Acabe com os fantasmas da sua vida. Agradeça pelas boas coisas que já viveu.
Você tem todo o direito de parar sem saber o que vai fazer nesse tempo. Ele vai servir para você se reconectar aos seus instintos, saber quem você é, o que quer e para onde vai. Não faça metas, apenas sinta novos desejos. Tire da gaveta antigos planos e sonhos. Se permita ter vontade de fazer coisas novas. Decida ser a heroína da sua própria vida!
Se transforme: pare de ter comportamentos que não são mais úteis na sua vida. Reveja o seu modo de falar, de pensar, de agir, de reagir. Fiquei de olho nos seus sentimentos e, principalmente nos seus pensamentos. Pare com o auto-boicote! Organize a sua rotina, os seus horários e as suas tarefas.
Dê uma atenção especial para seu corpo: como anda seu sono, sua alimentação, sua saúde seus dentes? Faça um check up. Os últimos tempos de privação podem ter trazido danos também para o seu corpo.
E agora?
Agora espere
Nenhuma solução mágica vai aparecer. Você não vai dormir como uma escrava e acordar como uma loba. Espere. Toda essa transformação vai acontecer aos poucos, dia após dia. Só lembre de continuar firme e forte durante todo esse período. Vá resolvendo as pendências uma a uma, devagar, sem pressa nem ansiedade.
E o mais importante: não tenha hora para acabar. Pode durar um mês, seis meses, um ano, cinco anos. Não importa! Espero, dê tempo ao tempo e os insights virão! Você estará dando espaço para que sua alma se cure.
Fareje, procure, estude, seja curiosa, se deixe levar para todos os lados que seu instinto quiser. Você vai achar as respostas que está procurando. Você vai se tornar a mulher que quer ser. As grandes idéias vão vir naturalmente. Quando perceber, as grandes decisões já estarão tomadas.
“Em termos psíquicos, é bom criar um local intermediário, uma estação secundária, um lugar bem-escolhido, quando se escapa da fome. Não é demais tirar um ano ou dois, para avaliar os nossos ferimentos, procurar orientação, ministrar os medicamentos, meditar sobre o futuro. Um ano ou dois é um tempo limitado. A mulher braba é aquela que está tentando voltar. Ela está aprendendo a acordar, a prestar atenção, a parar de ser ingênua, desinformada. Ela apanha a vida nas próprias mãos. Para reaprender os instintos femininos profundos, é essencial, para começar, que se veja como eles foram destituídos.”
Lição do Dia: permanecendo firme e forte no meu período sabático.
Pendências: mais um desequilíbrio financeiro.